“Antes de começares a ler… arranja a posição
mais cómoda: sentado, estendido, enroscado, deitado. Deitado de costas, de
lado, de barriga. Na poltrona, no sofá, na cadeira de baloiço, na cadeira de praia,
no pufe. Numa cama de rede, se tiveres alguma cama de rede. Em cima da cama,
naturalmente, ou dentro da cama. Até podes pôr-te de cabeça para baixo, em
posição de ioga. Com o livro virado ao contrário, bem entendido. (…)
Bem, afinal, de que estás à espera? Estende
as pernas, estica também os pés numa almofada, em duas almofadas, nos braços do
sofá, nas orelhas da poltrona, na mesinha de chá, na secretária, no piano, no
mapa-mundo. Descalça primeiro os sapatos. Mas só se quiseres ficar de pés
soerguidos, porque senão torna a calçá-los. E agora não fiques para aí de
sapatos numa mão e livro na outra. Regula a luz de modo a não te cansar a vista.
Fá-lo já, porque assim que estiveres mergulhado na leitura, nem penses em
mexer-te. Arranja-te de maneira a que a página não fique na sombra, um
emaranhado de letras negras sobre um fundo cinzento, uniformes como uma ninhada
de ratos; mas tem cuidado para que não lhe bata de chapa uma luz demasiado
forte e que não se reflicta no branco cru do papel roendo as sombras dos caracteres
como um meio-dia do sul. Tenta prever agora tudo o que puder evitar-te interromper
a leitura. Os cigarros ao alcance da mão, se fumares, o cinzeiro. Que mais é
que falta? Tens de ir fazer chichi? Bem, tu é que sabes!”
Italo Calvino
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